A primeira vez que um artista de efeitos especiais teve que testemunhar que seu trabalho era falso foi em 1971, no filme "A Lizard in a Woman’s Skin", de Lucio Fulci quando Carlo Rambaldi foi acusado de usar cães de verdade na cena onde havia uma vivissecção. O efeito dos cães abertos e com o coração ainda batendo foi considerada tão realista que Rambaldi teve que aparecer no tribunal com os cães falsos para provar que nenhum animal foi prejudicado.
Agora, mais de 40 anos depois, um bizarro processo judicial da mesma forma está acontecendo em Quebec. Remy Couture, um artista de efeitos especiais de horror (Montreal) foi acusado em 2009 por "corrupção da moral" após uma queixa (que pode ser lida em inglês aqui) feita sobre as imagens encontradas em seu site "Inner Depravity". A acusação, originária da Alemanha, foi comunicada à polícia de Montreal pela Interpol, e dado que as imagens chocantes envolviam cenas de tortura e o assassinato de um adolescente, a polícia sentiu-se compelida a investigar.
Depois dos oficiais enganarem Couture colocando-se como clientes solicitando maquiagens de Halloween ele foi preso e levado sob custódia. Teve seu apartamento revistado onde a polícia encontrou a oficina do artista, repleta de próteses de membros, cabeças, sangue falso, maquiagem e outros materiais profissionais. Esta evidência, juntamente com a insistência de Couture de que as imagens denunciadas tratavam-se de obras de ficção, levou a polícia a libertá-lo no mesmo dia. Infelizmente os censores locais aproveitaram a deixa para mover um processo contra Remy Couture sobre a acusação de que seu trabalho incita o ódio e a degradação ao sexo feminino e o artista foi preso novamente. Até hoje o processo judicial ainda está em curso.
Em uma entrevista, ele expressou a descrença de que ele estava sendo perseguido injustamente pela lei, enquanto "crimes reais" estavam acontecendo. "É um absurdo", disse Couture, "O que eu faço é arte. De certa forma é melhor ver pessoas gastando seu tempo no meu arquivo ao invés de consultarem fotos reais de crimes violentos". Remy Couture, 33, pretende argumentar também que há muitos outros filmes bem mais sangrentos e abusivos em circulação que não foram alvo de obscenidade, e ele quer saber por que.
Karine Fournier, um artista têxtil vestida como uma noiva zumbi se sentiu compelida a suportar a causa de Couture. "Para nós, perder a liberdade de expressão ", ela argumentou: "é a morte".
Julie Delisle, que também trabalha no gênero horror, disse que ficou surpresa com as acusações e agora se sente como "se estivéssemos sendo observados cada vez mais de perto ".
O advogado de Couture, Dominic Bouchard, disse que o caso poderia ter repercussões sobre os filmes de terror em geral. Bouchard disse também que é a primeira vez que uma acusação de obscenidade relacionada às obras do gênero horror foi estabelecida no Canadá. Mas acusações de obscenidade são controversas e complicadas. A Suprema Corte em 1992 reconheceu que as representações humilhantes e violentas de sexo podem fazer mal para a sociedade, especialmente as mulheres, e estabeleceu alguns testes nesse sentido.
Embora a polícia de Montreal alegue que denúncias foram feitas sobre o curta “Inner Depravity: Volume 1” mostrar uma criança sendo molestado e morta, Bouchard disse que eles estão errados. Os filmes de seu cliente retratam apenas um adolescente ser “morto” e não sexualmente violado.
De acordo com Couture, o sexo em seus filmes é simulado, em oposição à pornografia, em que o sexo é real. "Eles sabem que (meu trabalho) é tudo ficção ", acrescentou. “Ninguém é forçado a assistir” , Couture explicou através de um sorriso. "É horror" , disse ele, "não uma caricatura ".
Os dois curta-metragens de Remy Couture “Inner Depravity: Volume 1” e “Inner Depravity: Volume 2” (ambos com aproximadamente 10 minutos) e que traziam a alcunha "A humanidade tornou-se mestre na arte de crueldade" estavam disponíveis no site do artista até sua prisão.
O julgamento de Rémy Couture terá lugar no início de 2012 no Palácio de Justiça de Montréal. Se Rémy for considerado culpado, ele pode ser condenado à prisão e ter um registo criminal sem cometer nenhum crime a não ser o de expressar sua arte e isso vai significar o fim da liberdade de expressão para as gerações vindouras.
O documentário Art/Crime, do cineasta Frédérick Maheux, (lançado em 2011 no Fantasia Festival) procura apresentar o caso de forma mais ampla e investigar as idéias correntes sobre arte, obscenidade e liberdade criativa e uma petição a favor do artista pode ser assinada aqui além de um site criado para defender os direitos de expressão do artista (Support Remy Couture).
Veja abaixo alguns dos trabalhos deste incrível profissional do horror.
(clique para ampliar a imagem)
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